Investing should be more like watching paint dry or watching grass grow. If you want excitement, take $800 and go to Las Vegas. Paul Samuelson
Após explorar diferentes temas em nossas Cartas anteriores, agora nos concentramos nas “Pílulas da Academia”, onde discutiremos o fator de baixo risco – comprar ativos com baixo risco e vender aqueles com alto risco. Contudo, antes de prosseguirmos com o tema em questão, é importante estabelecermos os parâmetros desta discussão, que serão fundamentados nos critérios necessários para a identificação de um fator de risco, tal como delineado por Berkin & Swedroe.
Segundo estes autores, existem seis critérios que precisam ser satisfeitos para que um atributo de um ativo seja reconhecido como um fator de risco. O primeiro critério emerge diretamente da definição de um fator de risco, o que significa que a medida deve ser capaz de explicar o retorno de portfólios diversificados e gerar um prêmio de risco. Ademais, o fator precisa ser persistente, o que significa que deve estar presente em diferentes regimes econômicos e persistir ao longo de um extenso período de tempo. Deve também ser universal, ou seja, deve ser detectável em diversos mercados, países, setores e regiões.
Um critério adicional importante é a robustez, que sugere que diferentes “expressões” do mesmo candidato a fator de risco devem continuar a explicar os retornos e a produzir prêmios. Além disso, o fator deve ser investível, o que significa que deve persistir mesmo quando se consideram os custos de transação e outras fricções associadas. Por último, o critério de intuição é relevante, já que devem existir explicações econômicas ou comportamentais que justifiquem a presença do prêmio vinculado ao fator.
Persistente
Para ilustrar a persistência do fator de baixo risco, os autores Baltussen, Swinkels & van Vliet (2021) conduziram uma análise que abrange um período vasto, estendendo-se de 1800 a 2016. Essa janela de tempo extensa proporciona uma visão abrangente da idade contemporânea. Por exemplo, em 1800, a era Napoleônica estava em seu início; poucos anos antes havia ocorrido a primeira eleição presidencial dos Estados Unidos; e a população de Ouro Preto era semelhante à de Nova York.
Através desses dados, os autores conseguem demonstrar uma sólida presença do fator de baixo risco em ações, embora com uma magnitude menor em commodities, moedas e títulos de dívida. Além disso, ao observar 74 anos de recessão e 143 anos de expansão, bem como 52 anos de crises e 165 anos de estabilidade, além de 43 anos de mercados em queda (bear market) e 174 anos de mercados em ascensão (bull market), os pesquisadores evidenciam a presença constante do fator de baixo risco nesses diferentes estados. No entanto, ele se mostra mais proeminente durante períodos de expansão econômica e mercados ascendentes.
Universal
O fator de baixo risco pode ser descrito como um dos mais abrangentes, sendo observado em diversos tipos de ativos e países. Por exemplo, Jensen, et al. (2022) analisaram mais de 150 anomalias em ações, destacando que a estratégia de baixo risco é replicável em todos os casos, tanto em mercados emergentes quanto nos Estados Unidos e outros países desenvolvidos. Em contraste, Hou, et al. (2020) replicaram 452 anomalias em vários horizontes temporais, notando uma vantagem numérica dos ativos de baixo risco em relação aos de alto risco, embora, em termos gerais, sem evidências estatísticas de superioridade.
Em relação às classes de ativos, a anomalia baixo risco parece estar presente em todas. Além do mercado acionário abordado no parágrafo anterior, existem evidências da presença do fator baixo risco em títulos governamentais (Pilotte & Sterbenz (2006), Frazzini & Pedersen (2014)), títulos corporativos (De Carvalho et al. (2014), Derwall, et al. (2009)), ETFs e opções (Frazzini & Pedersen (2022)).
Robusto
O fator de baixo risco apresenta diversas manifestações, contribuindo para sua robustez. Para além das variações ligadas ao período de análise, esse fator apresenta múltiplas nuances. Black (1972) foi o primeiro a destacar que a relação risco-retorno proposta pelo CAPM era menos pronunciada do que se esperava, sugerindo que os ativos mais arriscados não proporcionavam a compensação prevista aos investidores. Contudo, Haugen & Heins (1975) foram os primeiros a identificar a anomalia de baixo risco, observando que portfólios com menor variância proporcionavam retornos maiores que seus equivalentes de maior variância.
Mais recentemente, Blitz & van Vliet (2007) analisaram essa hipótese de forma mais sistemática e abrangente, confirmando que, de fato, existia um prêmio ao se optar por ações de baixa volatilidade em detrimento das de alta volatilidade. Paralelamente à abordagem baseada na volatilidade, Frazzini & Pedersen (2014) mostraram que a compra de ações com betas mais baixos também resultava em um prêmio em relação às ações com betas mais altos (Betting Against Beta). Por fim, na mesma linha de raciocínio, Ang, et al. (2009) apresentaram evidências adicionais da existência do fator volatilidade idiossincrática – a compra de ativos com baixa volatilidade do erro de regressão dos retornos do ativo em relação aos retornos dos fatores de risco.
Investível
Conforme apontado por van Vliet (2017), o volume de negociações (turnover) dos ativos de alta volatilidade é quase quatro vezes maior que o dos ativos de baixa volatilidade, sugerindo uma atividade mais intensa nos ativos de maior risco. Entretanto, os autores salientam que os ativos de baixo risco possuem, em média, uma capitalização de mercado cinco vezes superior à dos ativos de alto risco. Assim, a maior capitalização de mercado mais que compensa a menor quantidade de negociações, fazendo com que os ativos de baixa volatilidade sejam 30% mais líquidos em termos de volume financeiro transacionado.
Além disso, os autores enfatizam que modelos convencionais de estimativa de custos de transação tendem a assumir uma correlação positiva entre custos e volatilidade e uma correlação negativa entre volume financeiro negociado e capitalização de mercado (Keim & Madhavan (1997), e.g.). Portanto, os ativos de baixo risco são menos custosos para serem negociados, pois possuem uma capitalização de mercado maior, menor volatilidade – por definição – e maior volume de negociação.
Finalmente, cabe responder uma última questão. Como estratégias baseadas em fatores de risco tendem a ser de compra e venda (Long & Short), um custo de transação menor para o lado da compra (baixo risco) implica em custos de transação maiores para o lado da venda (alto risco). Assim, se a parte de venda for crucial para a estratégia, um custo de transação mais elevado para esse portfólio poderia inviabilizá-la por completo. No entanto, Blitz, et al. (2019) demonstram que, na presença da ponta comprada, a ponta vendida não adiciona valor ao portfólio. Isso sugere que custos de transação maiores para o portfólio vendido tendem a ter um impacto insignificante na estratégia.
Intuitivo
À primeira vista, o conceito de investimento de baixo risco pode parecer contraintuitivo. De fato, muitas experiências cotidianas parecem sugerir o oposto: se todos escolhessem o caminho mais seguro e fossem recompensados por isso, não haveria inovação, as empresas estagnariam e as pessoas se contentariam com uma rotina previsível e monótona. No entanto, conforme detalhado por Blitz, van Vliet & Baltussen (2019), vários fatores são combinados para fazer da anomalia baixo risco uma exceção que não contesta diretamente nossas convicções e atitudes em relação à incerteza como fonte de oportunidades.
Um dos argumentos centrais envolve as restrições enfrentadas pelos investidores institucionais. Estes frequentemente são impedidos de operar com alavancagem devido ao seu mandato, o que os leva a buscar alternativas para aumentar os retornos. Uma solução comum é investir em ativos mais arriscados. Esta demanda adicional por tais ativos pode distorcer a relação tradicional entre risco e retorno, tornando-a menos proeminente.
Outra linha de pensamento, defendida por Baker, Bradley e Wurgler (2011), propõe que muitos investidores não buscam maximizar o retorno absoluto, mas a probabilidade de superar o mercado. Sob esta perspectiva, e considerando a validade do CAPM, os ativos de baixo risco podem parecer menos atraentes, pois tendem a apresentar um maior tracking error e um menor retorno esperado.
Do ponto de vista comportamental, a predileção por pagamentos do tipo loteria, conforme descrito por Kahneman & Tversky (1979), pode ampliar a demanda por ativos de alta volatilidade, dado que esses ativos apresentam um downside limitado, mas um upside ilimitado. Além disso, o viés de representatividade, que indica que investidores seriam mais propensos a adquirir ativos voláteis que aparecem frequentemente nas notícias (Barber & Odean (2008)), também desempenha um papel significativo.
Para concluir, a anomalia de baixo risco satisfaz todos os critérios para ser classificada como um fator de risco. Sendo assim, pode ser uma adição valiosa para qualquer carteira de investimentos. Em nossa abordagem, empregamos regularmente o fator de baixo risco, integrando-o frequentemente com outros fatores para melhorar a eficácia. De fato, Luciano França, nosso gestor, concentrou sua dissertação de mestrado precisamente neste tópico, explorando o fator de baixa volatilidade no mercado brasileiro.